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terça-feira, 26 de junho de 2007

Século XX. O século da urbanização.


I. O século XX foi o século da urbanização. O século em que mais da metade da população mundial abandonou as áreas rurais para acorrer para as zonas urbanas.
Mas, será que toda essa população teve sucesso na empreitada? Será que ao empilhar-se em áreas internas ou externas às cidades não alcançadas pelos benefícios próprios da urbanização essa população terá realmente se integrado ao modo urbano de vida? Ou será que o século XX, ao contrário, foi, na verdade, o século da favelização?
O fato é que essa população deixou o campo e acorreu para as cidades que se mostraram despreparadas e desinteressadas na acolhida desses cidadãos que, sem recursos para arcar com a aquisição de lotes urbanos e para a construção da moradia pelos meios convencionais, como o mercado imobiliário, as políticas habitacionais, o aluguel e as entidades filantrópicas, lançaram mão de diversas estratégias de acesso à alguma forma de habitação, que se assemelham, no produto final, pela precariedade das condições sócio-ambientais e por ressaltar o caráter de exclusão social.
Dentre essas estratégias destacam-se a criação das favelas, a transformação de prédios unifamiliares em cortiços multifamiliares, o adensamento de loteamentos periféricos destituídos dos equipamentos urbanos mínimos e pressão política pela construção dos conjuntos habitacionais, que, pelas condições em que são construídos, se constituem em das formas de favelização das áreas urbanas.
Tais assentamentos irregulares carregam duas cargas negativas. A primeira, resulta da ausência dos requisitos urbanos e arquitetônicos capazes de tornar digno o acesso dessas populações à cidade, bem como das conseqüências que acarreta para a população envolvida. A segunda, por ocupar fisicamente espaços públicos importantes para a cidade, para os quais foram projetados ruas, praças, quarteirões, parques etc., constituindo, assim, focos potenciais de doenças, contaminações e outras ameaças à saúde pública coletiva.
Para essa população o apossamento da terra pela invasão ou ocupação irregular é uma resposta involuntária ou deliberada à própria incapacidade de aquisição pelos meios convencionais e, nesse sentido, a arquitetura, capaz de oferecer soluções técnicas adequadas e qualidade de vida fica relegada à um segundo plano, considerado custo não essencial e postergável. Esse posicionamento, aceitável quando da intervenção individual para a construção da habitação, é, no entanto, repetido e reproduzido por ocasião das intervenções públicas destinadas à urbanização e revitalização da área, com prioridade ao terreno e material de construção.
São semelhantes do ponto de vista da tipologia habitacional resultante dos dois processos, mas diferem quanto à possibilidade de intervenção – para a melhoria das condições de habitabilidade, em função de variáveis como propriedade da terra, localização, adensamento e definição dos atores responsáveis pela provisão de serviços e equipamentos.
Nesse contexto é que surge a chamada “arquitetura silenciosa” ou, para outros, a “arquitetura possível”, assim entendida como a arquitetura surgida do envolvimento da população com a produção de seus espaços de moradia, de lazer, de trabalho, entre outros, cuja face mais visível é a autoconstrução, moradia feita por etapas, conforme a possibilidade financeira da família em que os cômodos vão sendo agregados de acordo com as necessidades, as condições de iluminação e ventilação variam em função do custo das esquadrias disponíveis e o revestimento e pintura somente terão vez quando outras necessidades com maior grau de prioridade tiverem sido atendidas.
Essa “arquitetura” tem como ponto positivo o aproveitamento de usos e costumes e de know how com características regionais e culturais, de processos construtivos e de uso de materiais. Tem, no entanto, como ponto negativo, a inadequação técnica dos edifícios, necessária para prover qualidade de vida aos seus moradores.



II. No Século XX vivemos o século da urbanização, em que mais da metade da população mundial passou a viver em cidades, “desligada”, no dizer de Mike Davis (1), “da industrialização e do desenvolvimento”, provocando uma favelização generalizada em que vivem mais de um terço da população urbana global.
A novidade é que o maior crescimento populacional tem ocorrido nas cidades médias e não nas megalópoles, fazendo surgir cidades inteiramente favelizadas, nas quais se sobressai um “proletariado informal”, sem qualquer organização coletiva e sem qualquer perspectiva de incorporação ao mercado de trabalho.
Wisnik demonstra a dicotomia entre o modo ocidental e oriental, liberal e socialista de enfrentamento da urbanização. De um lado, a Inglaterra, primeiro país a se industrializar e a se urbanizar, que, no entanto, manteve a estrutura rural intacta. De outro, os territórios chinês e soviético, ambos de tradição camponesa, mas, em profundo processo de industrialização, com tendência a conformar regiões em que o urbano e o rural se confundem.
Essa confusão, na visão de Wisnik, se aproxima da configuração territorial proposta por Marx, que previa a abolição gradual da divisão tradicional do trabalho entre o campo e a cidade, através da distribuição mais equânime da população na terra. Cita, como exemplo, a área do delta do Rio Pérola, onde, com a explosão econômica em Shenzhen, se formou uma rede contínua de vilas promovidas a cidades, sem centro urbano e grande densidade demográfica, englobando campos agrícolas, aldeias, vilas, lugarejos, cidades e megalópoles, formando uma imensa extensão suburbana, que explicita um novo modelo de crescimento urbano em que o subúrbio não é mais a margem residual da cidade e sim a sua própria essência.
No Brasil, o crescimento urbano continua a ocorrer nas franjas das megalópoles e já produz efeitos danosos também nas cidades médias, principalmente do Sul e Sudeste, com as mesmas características informados por Mike Davis, favelização generalizada e formação de proletariado informal com reduzida chance de acesso ao mercado de trabalho formal e organizado.
Não se encontra no país paralelo com o fenômeno descrito por Wisnik para o território chinês, uma vez que a economia suburbana nas grandes e médias cidades brasileiras depende, ainda, dos grandes centros urbanos que concentram a produção industrial e comercial.